segunda-feira, 15 de setembro de 2014

desexistência


Andando pelas ruas, os olhos das gentes não olhavam mais os seus.
Nem lhe fitavam o andar ou se assombravam com suas cicatrizes ou com seus cabelos despenteados deixados livres por tempo demais.
Não lhe retribuíam sorrisos ou lhe faziam gracejos ou lhe reconheciam as doçuras.
Estando entre seus pares não lhes causava mais encanto, ou desejo, ou vontade, ou saudade, ou espanto.
Seguindo seus caminhos vivia, sentia e contemplava o mundo e os dias sem ter público para suas canções, ou devaneios, ou receios, ou sentimentalidades.
Seu mundo tornou-se estranho.
Solitário.
Doce.
Melancólico.
Duro.
Complicado.
Calmo.
Confuso.
Não sentia mais as gentes, nem seus tormentos, nem sua afabilidade.
Não vivia mais os pares, nem os tocava o corpo, nem lhes sentia os afetos.
Não coloria mais os caminhos, nem os contemplava.
Deixou de ver o mundo, ao se perceber invisível.
E desexistiu.