quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

seu colo agora

E se eu tivesse seu colo agora.
Me aninharia por cinco minutos inteiros.
Te agradeceria por todos os segundos.
E lhe maldizeria pelo resto da vida.
Por me privar do seu cheiro.
Por me fazer acreditar tanto nos dias.
Por me permitir desejar horas melhores.
Se eu tivesse seu colo agora.
Essa TV estaria calada.
Meus olhos estariam fechados.
A contagem das horas seria menos sofrida.
Se eu tivesse seu colo agora.
A madrugada seria pequena.
Seria eterna.

das cinzas


Ele não enxergava mais as rotinas.
Não via as regras.
Nem ouvia os conselhos, nem os provérbio populares.
Não mais se lembrava desses ditos.
Seu coração tinha muito mais em que pensar.
De tão assustado, já não se deixava perceber o outro.
Conhecia os desejos do mundo, os anseios da alma.
Conhecia as ofertas dos dias e as saudades das horas.
Mas seus últimos tempos lhe pareciam injustos.
Passara eras inteiras em tempestades, dias inteiros de tormentas.
Desaprendeu a ganhar presentes do acaso e dos deuses.
Há muito não reconhecia mais os sorrisos.
Nem compreendia as artimanhas do humano.
Mas com passos curtos levava um sorriso simples.
E seguia.
Numa tarde azul com aroma de dia qualquer, foi tocado diferente.
Encontrou-se frente a frente com a feição da esperança.
E encantou-se com seu cheiro.
Com o gosto de vida que seus suspiros ainda melancólicos por tanto tempo lhe ocultaram.
E amou.
Amou como se não houvesse prazo.
Nem dias, nem sol e nem lua.
Se entorpeceu como se nem fosse mais corpo.
Transformara-se em sopro divino.
Gargalhou como se não adorasse mais o silêncio.
Voltou a viver.
Como se outrora não tivessem lhe matado os afetos.