quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

o dia em que o amor morreu


O amor morreu numa tarde de terça-feira.
Sem grandes alardes, sem sirenes tocando, sem estardalhaços ou gritos desesperados que o mundo costuma esperar quando se morre alguém tão querido.

Era um dia como outro qualquer, desses com gente correndo, hora passando, horário atrasando.
Nesses dias em que a gente acorda cedo e vai seguindo o itinerário.
Segue, anda, para, respira, sorri, se cansa, come, corre, volta e vai.

No dia que o amor morreu, a manhã amanheceu chuvosa e fresca.
Não era feriado nacional, não acontecia nada de extraordinário no mundo.

O amor morreu sem agonizar de doença grave, sem sentir dores profundas, sem sangrar, sem proferir gritos ou gemidos.

O amor não deu suspiros de adeus, não lamentou o não vivido, não agradeceu aos céus ou pediu perdão.
O amor não pediu uma última chance, não suplicou misericórdia em recompensa dos seus bons atos, não se sentiu merecedor de oportunidades de recomeço.

Não, o amor não se matou de descrença.
Nem morreu de tédio.
Não mataram o amor a pancadas.
O amor não foi assassinado pela dureza do mundo, nem das gentes.

O amor morreu de morte morrida.
Morreu após percorrer seu caminho, escrever sua história, causar alguns sobressaltos, outros tantos sorrisos.

O amor morreu de alívio, depois de sentir seu papel cumprido.
E ainda dizem por aí que continuou vivo, no gosto do abraço do encontro, no cheiro do toque da pele, nas lembranças dos dias simples – naquele espaço e tempo em que pareceu ser eterno.

domingo, 4 de agosto de 2013

quando a solidão não era castigo


Eu poderia dizer que o mundo anda mais endurecido, que as pessoas andam mais egoístas, que as escolhas estão mais difíceis.

Eu poderia culpar a correria dos tempos, o estresse de todo mundo, o estúpido mercado que me obriga a consumir até meu próprio corpo, a política, a polícia, o silêncio, a mãe, o pai, o Freud.

Eu poderia apontar um conjunto de fatos, um punhado de histórias, um combo de variáveis de desencontro.

Mas nada disso tiraria da boca esse gosto de remédio amargo, de chá forte feito pela tia bem intencionada que te arranca a alma junto com toda podridão do corpo e bota fora com o ácido que sobe estomago acima quando se engole.

Nada disso tiraria o cheiro de empoeirado dos sonhos e planos abandonados debaixo do tapete porque não se pensou que se precisaria de ilusões para viver.

Nada disso removeria a fraqueza da carne que se esgueira por entre as alegrias dos outros com suas vidas que correm perfeitamente bem e com seus problemas que desaparecem como que por encanto.

Eu gostaria apenas da vista dos tempos das calmarias, dos dias de paz em que eu andava pelas ruas e não me lembrava do mundo, quando meu silêncio era abrigo, minhas ideias minhas companheiras e a solidão não era castigo.