quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

das cinzas


Ele não enxergava mais as rotinas.
Não via as regras.
Nem ouvia os conselhos, nem os provérbio populares.
Não mais se lembrava desses ditos.
Seu coração tinha muito mais em que pensar.
De tão assustado, já não se deixava perceber o outro.
Conhecia os desejos do mundo, os anseios da alma.
Conhecia as ofertas dos dias e as saudades das horas.
Mas seus últimos tempos lhe pareciam injustos.
Passara eras inteiras em tempestades, dias inteiros de tormentas.
Desaprendeu a ganhar presentes do acaso e dos deuses.
Há muito não reconhecia mais os sorrisos.
Nem compreendia as artimanhas do humano.
Mas com passos curtos levava um sorriso simples.
E seguia.
Numa tarde azul com aroma de dia qualquer, foi tocado diferente.
Encontrou-se frente a frente com a feição da esperança.
E encantou-se com seu cheiro.
Com o gosto de vida que seus suspiros ainda melancólicos por tanto tempo lhe ocultaram.
E amou.
Amou como se não houvesse prazo.
Nem dias, nem sol e nem lua.
Se entorpeceu como se nem fosse mais corpo.
Transformara-se em sopro divino.
Gargalhou como se não adorasse mais o silêncio.
Voltou a viver.
Como se outrora não tivessem lhe matado os afetos.

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