domingo, 4 de abril de 2010

sem brilho


Ela que nunca teve a predileção doce pelos vitimizados, amanhece em choque.
Acorda mais um dia com aquele pensamento intruso que insiste em a colocar em situação indigna.
Nunca quis merecer a  pena alheia e agora está pasma: experimenta a nada agradável sensação de auto piedade.
Em seu íntimo, espera ansiosamente que os outros lhe olhem com olhos de comiseração e lhe ofereçam o colo que se oferece aos esquecidos pela vida.
Sim, ela morre de pena de sim mesma. Considera-se hoje, injuriada pelo mundo.
Passa seus dias ruminando, numa incansável procura pelas lacunas que por ventura tenha deixado e que expliquem sua falta de sucesso em seus propósitos.
Refaz em pensamento os trajetos que percorreu por escolha e com empenho.
Recorda os caminhos traçados adorável e credulamente cujas metas eram boas, em essência.
No meio do dia, revê como que numa reprise dum filme clássico, as situações e circunstâncias em que optou pelo outro, em que se colocou em milésimo plano, com apenas a esperança de ser merecedora de alcançar o mérito do cuidado dedicado; apenas à espera de conhecer a reciprocidade autêntica daqueles por quem tem tanto afeto.
Vive agora em meio a um turbilhão de sentimentos e sensações ruins. Mistura-se às tristezas, revoltas e mesmo às culpas pelo fracasso pessoal que estampa no peito e parece lhe deixar o corpo sem forças.
Na verdade, só queria não carregar na alma os estigmas de não encontrar o reconhecimento pela sua dedicação.
Só ambiciona sentir-se amparada e acolhida pelos braços do amor que tanto precisa e procura.
E nessa busca por seus erros e acertos, quase se convence de que merece compaixão pela sua melancolia que se arrasta pelos dias.
Mas reconhece que em meio a seus anseios de acalmar os humores, muito já se equivocou nos desejos e nos atos.
Revolta consigo mesma, mas se perdoa ao se lembrar de que mundo também erra.
Conforta-se pensando que um caminho solitário é sempre mais cheio de espinhos, ou simplesmente tem desafios que parecem mais ferozes.
Sim, seu coração sente que faz jus à clemência.
Numa última tentativa, roga aos céus, com uma fé que muitas vezes deixou guardada em silêncio. Suplica que a realidade tenha novas cores.
Mas nada. O mundo continua ileso, como se o cosmos não fosse capaz de nutrir por ela a mesma dedicação e carinho.
Procura não mais pensar.
Abafa seu pranto e sente que não tem mais escolhas.
Só lhe resta seguir em frente.
Sem brilho.

Um comentário:

  1. Idem a tudo.

    Opto por jogar a mochila nas costas e seguir, sem deixar marcas e sem levá-las. Sou estrangeiro onde quer que eu vá.

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